por Geraldo Nogueira Batista * |

Abandono antigas convicções sobre este mítico logradouro de Brasília. Sua revitalização não deve ir pelo desejo de restaurar a importância que ela teve no passado. Tentar recuperar valores de um tempo que se foi, é inócuo. Melhor examinar novas questões e demandas para valorizar o presente e o futuro da cidade.

A revitalização da W3 é importante para a correção de erros cometidos, tanto quando da elaboração proposta urbanística da cidade, quanto ao longo de sua implantação. Uma W3 revitalizada é essencial para superar desvios que reponham a cidade no rumo da recuperação dos setores comerciais da cidade. Tal revitalização pode ser efetivada sem nenhum questionamento à legislação de tombamento da área. Este processo, ao contrário, fortaleceria a escala gregária e contribuiria para a melhoria da qualidade de vida do Plano Piloto e do conjunto da cidade.

Brasília tem perdido valores associados à escala gregária concebida por Lúcio Costa. O uso da W3 como espaço público, local de encontro e de expressão de valores gregários, foi trocado pela ida aos shoppings. Recentemente, a oferta de variados equipamentos de lazer e esporte em empreendimentos residenciais, também tem contribuído para a perda de vitalidade dos espaços públicos. Outro fator a ser considerado é a precariedade do transporte público. Repita-se, à exaustão, que a desvalorização da W3 está associada à predominância exacerbada da cultura do automóvel na cidade.

Creio que a revitalização da W3 não deve ser feita por projetos e iniciativas urbanísticas impactantes. Também acredito que intervenções estarão mais na linha do que hoje se chama urbanismo tático. Descartando projetos grandiloquentes, há a necessidade de “baixar o avião”, inverter raciocínios e adotar outros enfoques. Propostas de alterações se resumiriam a intervenções físicas de pequeno porte, implementadas de forma incremental. Aproximações graduais seriam a régua a ser usada para ditar o ritmo do processo de revitalização da via. Não há necessidade de vultosos recursos financeiros públicos.

Caberia ao setor público o papel de coordenar e de estimular iniciativas que seriam assumidas por agentes privados. A W3 não deve ser vista como um tema que se esgota nos limites das questões estritamente urbanísticas. Sua revitalização pode ser estimulada por meio da realização periódica de eventos culturais. Uma iniciativa que pode ser assumida como um projeto-chave da Secretaria de Cultura.

Penso no estímulo à instalação de pequenos conjuntos de atividades comerciais e serviços, passíveis de acesso tanto pela W2 como pela W3. Iniciativas comerciais que fugiriam do atual e danoso modelo dos shopping centers, imensos elefantes brancos, com paredes externas cegas e isolados do mundo exterior. Uma possibilidade seria a de se ter conjuntos de pequenas salas de cinema, em cada um dos trechos, Sul e Norte, da avenida. Eles poderiam também contar com livrarias, cafés, lanchonetes, restaurantes, teatros de bolso, salas de concerto, galerias de arte e outras atividades.

Outra iniciativa seria a da organização de uma programação cultural/musical em espaços determinados da W3. Na Praça 21 de Abril e em outros locais poderiam se realizar concertos, oficinas e eventos diversificados nos fins de semana. Os amantes da música criariam o hábito de frequentar estes espaços que, por outro lado, desempenhariam o papel de formação de público. Com um pouco mais de elaboração, as praças poderiam se especializar em um gênero musical, segundo as preferências do público ouvinte. A realização de eventos, como feiras de artesanato, livros e antiguidades, traria mais charme e animação aos espaços da W3. Seria desejável direcionar para a via a realização das inúmeras pequenas feiras livres que já ocorrem semanalmente nas asas Sul e Norte. Ao longo da avenida, poderiam se concentrar desfiles carnavalescos das escolas de samba e dos blocos que valorizam o carnaval de rua.

Por que não permitir, nas edificações das faixas 500 e 700, voltadas para a W3, o funcionamento de empreendimentos que atraiam público? Atividades como lanchonetes, restaurantes, pensões e quiosques de alimentação e prestação de pequenos serviços. Restaurantes poderiam se localizar nos lotes juntos às passagens que ligam a W2 a W3 no trecho Sul e nos que faceiam as praças no trecho norte da avenida. Há outras iniciativas que podem ser debatidas para a revitalização da W3. Uma delas é a retomada da proibição da circulação de veículos motorizados nos fins de semana (domingos e feriados). Nesses dias, a via seria livre apenas para pedestres, ciclistas e outros modos de locomoção não motorizada

Em resumo, priorizar ações que possam desencadear sinergias e multiplicar efeitos positivos. A W3 se tornaria um locus de atividades relacionadas ao lazer, à cultura, ao comércio e à gastronomia. Concluindo, há que dizer que a presença do uso habitacional é necessária. A presença de moradores gera demandas comerciais e de serviços que seriam atendidas por empreendimentos localizados na avenida. Uma interação de atividades que, por si mesma, é o fator da revitalização que se procura.

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*Geraldo Nogueira Batista é arquiteto. Foi diretor da Faculdade de Arquitetura da UnB e presidente do Instituto dos Arquitetos – DF. Em seu livro, ALQUIMIA URBANA, editado pelo Coletivo Maria Cobogó – expõe suas reflexões sobre Brasília e outras cidades..