Ana Maria Lopes
Neste fim de ano dois grandes escritores completam o bicentenário de nascimento: Fiódor Dostoiévski e Gustave Flaubert.
Autores que revolucionaram o romance trazendo ao leitor um universo de contrastes entre a visão realista e a sofreguidão angustiante de seus personagens.
Flaubert, filho de família burguesa, sempre viveu de rendas. Dostoiévski, pobre, plebeu, vivia cheio de dívidas.
Entretanto, entre os dois observa-se uma linha de convergência que os levam a serem os mestres do romance e da modernidade literária.
A época em que viveram não foi de brincadeiras. Vários eventos iam modificando a vida e os costumes. A morte de Napoleão no exílio foi um desses momentos carregado de simbolismos, entre eles, o fim das narrativas épicas e o nascimento das sociedades modernas.
Flaubert vivia sob o reinado do “rei burguês”, Luís Filipe. Vivenciou, em seguida, a ebulição da Revolução de 1848.
Dostoiévski vivia sob um regime totalitário e sofreu a repressão à Revolta Decembrista. Passou anos em uma colônia penal.
Esses fatores, em pleno ano de formação dos dois autores, onde as ideias, a política e os sentimentos afloravam e se perdiam, foram decisivos para que ambos discorressem sob o ardor dos acontecimentos sociais.
Flaubert criou o narrador impassível, despido de retóricas, deixando ao leitor o julgamento e a interpretação dos fatos. É o discurso indireto e livre que se vê em Madame Bovary (1857), Educação Sentimental e em Bouchard e Pécuchet (1881).
Dostoiévski, por sua vez, percorre imagens grotescas e, por vezes, cômicas, ou pelo anseio romântico com feições cruéis. Características que encontramos e O Duplo, Memórias do Subsolo e nos grandes romances Crime e Castigo e Irmãos Karamázov.
Flaubert e Dostoiévski chegam à estatura grandiosa, cada um em seu gênero inconfundível. Porém, a síntese dos dois romancistas está no desencontro. É esse o elemento que dita a regra das narrativas dos personagens de onde tentam escapar em meio a anjos e demônios.
Estamos a comemorar o bicentenário desses imensos autores. Um russo e outro francês. Mas não há como não fazer uma reverência ao nosso “bruxo”. Machado de Assis foi a voz que se uniu ao realismo com sua crítica social e, principalmente, a crítica aos moralismos da elite burguesa.
Ganhamos todos. Ganha o romance moderno com seus grandes autores. Autores que nos trazem a literatura que transforma, oprime, espanta e que nos faz viver.
Ana Maria Lopes é ecritora, jornalista, leitora compulsiva e uma das fundadoras do Coletivo Maria Cobogó.
Fiódor Dostoiévski é considerado um dos maiores romancistas da história. Nasceu em Moscou em 1821 e escreveu dezenas de livros, entre os quais Gente Pobre, O Duplo, Recordações da Casa dos Mortos, Crime e Castigo, O Idiota e os Irmãos Karamázov.
Gustave Flaubert marcou a literatura francesa e mundial pela profundidade de suas análises psicológicas e pelo seu senso de realidade. Nasceu em Rouen em dezembro de 1821. Entre seus livros maiores estão Madame Bovary, A Educação Sentimental, Salamnbô e Trois Contes.
Machado de Assis era carioca e considerado um dos maiores da nossa literatura. Escreveu quase todos os gêneros literários e introduziu o realismo no Brasil comentando e criticando os eventos político-sociais da época e sobre a moral burguesa vigente. Sua obra é extensa e tem Memórias Póstumas de Brás Cubas como ícone do movimento realista.
Maravilha. Amo esses gênios do romance. Belo texto nos relembrando..
Cara Ana Maria Lopes, gostaria de lhe parabenizar por este trabalho de Literatura Comparada muitíssimo interessante.! Você tem livros publicados? Entre em contato por favor.
Um abraço amigo.
Escritora Valdívia Beauchamp