Miriam Dascal*
Você mergulhado em você, ainda não é um NÁUFRAGO, pensa que sim, começa revelação na pele, na calmaria no útero do mar, tesão, prazer, orgasmo incandescente, neste abismo de águas…Olhar discreto, pelas goelas do meu corpo o verde me penetra, os homens martelam, vozes ao vento, chiados de máquinas cortantes, cadê as vozes? Só alaridos… Os escombros irão de vir ?
Continuam com os martelos são vozes daqueles de baixo do sol… Onde estão as Manuelas, Manú minha criança perdida, vai-te ao sol senão te perdes e olvides meus gemidos, meus temores, mágoas e vozes do abismo… Vai-te ao sol minha criança, não te percas consumida pelas dores das vozes ensandecidas! vai vai minha criança… Mergulha neste verde ensolarado, neste flúor que mastigas com sabor de alegrias, se esvaem de repente.
O vento te consola, as folhas cadentes te distraem, emerges em forças paradisíacas distrai-te mulher com os insetos que mal sabem de onde vem e para onde vão, vida cotidiana que carregas também sem saber o rumo das estradas, a vida te consola enquanto não te consome. Deixa vir os sons das flores, deita-te no mel das cores, desvanece nos tons sombrios, nas coloridas maravilhas espalhados no chão onde os pisos estão sem brilho de lembranças já guardadas sem o sabor de frutas frescas que estão prestes amadurecer neste teu colo que germina sementes desconhecidas que saltam aos teus olhos e mergulham na terra fria, úmida e onde outras sementes jazem na perdida esperança de encontros e abraços, na busca e na fome do presente sabendo que o germe está lá, lá bem dentro, sepultado com os teus mais antigos, medalhas, cacos, enterrados mesclados nos escombros, que perecem o teu âmago como terras desconhecidas e aventuras vividas, deixa-te levar por estas vias de certo encontrarás nas tuas veias antes dormidas e falidas agora vivendo teu dia dia.
Amanhecendo, chuviscos, na minha solitude e do mundo, lágrimas do tempo, solitude juntas uni-vos! Estou preguiçosamente amanhecendo chuviscos lágrimas do tempo estou só, estás só, solitude no mundo todo, uni-vos!
Mas tudo muda, o sol chegou, os pássaros em sintonia ninguém está só, milhares e milhares de seres vibrando em nossa volta, um eco do mundo, não há caos, ao contrário forças poderosas, potências de vida, vibrações infinitésimas, infinitas que não conseguimos captar, vida vida vida sem fim.
Carrega e descarrega pra que tanto, os corpos se afinam, os desejos se despertam, tudo que está tão longe aproximasse, não há vício há imaginação, o mundo telepático, sinto, tonia, sintonia com a natureza.“
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Miriam Dascal é mestre em artes cênicas pela Unicamp, bailarina, pedagoga do movimento e escritora. Escreve textos com o corpo e faz relatos como quem dança. Sintonia foi escrito na primeira semana da quarentena e ganhou uma perfomance: https://www.facebook.com/100001784769957/posts/2931766650226132/?d=n
Imagem: Marco Mazzoni Zupi