Por Nate DiMeo*|
Samuel Finley Breese Morse passou os primeiros vinte e cinco anos da vida aprendendo a pintar.
Em Andover. Em Yale. Em Londres, na Real Academia. Ele estudou obras dos mestres para aprender como Michelangelo construía corpos que pareciam pulsar e estremecer apenas com óleo, sombras e hachuras. Para aprender como Rafael invocava a fagulha de toda uma vida interior com um único toque de tinta branca pura no ocre opaco dos olhos de uma mulher da nobreza. Para aprender a criar ilusões de espaço e de distância. Para aprender a presentificar o inefável através da mera ilusão de linhas e pontos sobre a tela esticada.
Ele aprendeu a pintar.
E em 1825 Morse está morando em New Haven, Connecticut, com sua esposa Lucretia e dois filhos pequenos. E um terceiro filho a caminho. Podia nascer a qualquer momento.
Um dia, à noite, um mensageiro entregou uma carta: a prefeitura de Nova York queria pagar mil dólares para Morse pintar um retrato do marquês de Lafayette.
O herói da Revolução viria a Whashington para comemorar os cinquenta anos do início da Guerra. E posaria para Morse.
Se o pintor pudesse se por imediatamente a caminho.
Então ele embrulhou o cavalete, pinceis e tintas… E separou roupas decentes para encontrar um homem como Lafayette. E beijou a esposa grávida. E saiu, naquela noite mesmo.
Em outra noite, uma semana depois, Morse estava em seu estúdio alugado em Whashington, se preparando para a chegada, no dia seguinte, de seu célebre modelo. Ouviu alguém bater na porta. E lá estava um mensageiro. Sem fôlego, sujo, depois de um caminho difícil por trilhas difíceis. Que lhe entregou um bilhete com quatro palavras.
Esposa mal após parto.
Ele saiu naquela mesma noite, Viajou seis dias, sem parar.
A cavalo e em carroças sacolejantes, enrolado em cobertores para se proteger dos ventos frios das noites de outubro.
E quando chegou a New Haven e correu sobre folhas caídas atéa a casa na Whitney Avenue… soube que sua esposa estava morta.
Na verdade tinha morrido antes mesmo de o mensageiro bater à sua porta em Whashington. Na verdade, já tinha sido enterrada. Numa manhã em que ele estava na estrada. Enquanto ele corria para estar ao lado dela. Para cuidar dela até que melhorasse.
Samuel Finley Breese Morse passou os últimos quarenta e cinco anos de sua vida tentando impedir que mais alguém tivesse que se sentir como ele se sentiu naquela noite. Nunca mais.
Samuel Finley Breese Morse passou os quarenta e cinco anos seguintes.
inventando o telégrafo. Para transformar o espaço e a distância reais em ilusões. E desenvolvendo o código Morse. Pontos e linhas.
Que podiam transmitir o sentido de vidas vividas, de esposas falecidas.
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*Nate DiMeo é escritor, podcaster e roteirista americano. Seus textos são curtos, ágeis e divertidamente informativos. Constrói narrativas históricas de fatos pouco conhecidos. É autor de Palácio da Memória.
**Samuel Finley Breese Morse – foi inventor, físico e pintor de retratos históricos de personagens americanos. Ficou mundialmente conhecido pela invenção do telégrafo e do código Morse.