por Ana Maria Lopes * |
Caiu em domínio público. É a notícia boa desse janeiro de 2021. Agora, qualquer editora pode publicar o homem que escreveu “1984”, a “Revolução dos Bichos”, dezenas de outros livros e centenas de artigos e ensaios.
A notícia fez com que quatro editoras brasileiras se debruçassem sobre as obras de Orwell. Não sem motivos. Além da qualidade e da importância de suas obras, somente neste ano pandêmico de 2020, o autor vendeu mais de sessenta mil exemplares no Brasil. Números que fazem qualquer autor brasileiro roer as unhas até os cotovelos.
Orwell escrevia distopias literárias para compreender o presente. Suas narrativas são surreais, mas, no entanto, são igualmente lógicas e atuais.
Nasceu com o nome de Eric Arthur Blair, na Índia britânica, em Motihari. Adotou, em seu pseudônimo, o nome do rio Orwell, que deságua no sudeste da Inglaterra. Estudou, segundo ele, na “mais cara e esnobe das escolas públicas inglesas”, a Eton School. Foi na Eton que Orwell teve aulas com Aldous Huxley.
Sua vida foi agitada. Alistou-se e lutou na Polícia Imperial da Índia. Ali ficou tempo suficiente para começar a detestar o imperialismo britânico. Cinco anos depois, larga toda sua carreira militar e muda-se para Paris. A França lhe deu inspiração para escrever. Escreveu muito e destruiu tudo. Acreditava que faltava qualidade em seus escritos.
Passou fome, viveu nas ruas e conheceu o submundo parisiense. Mas, em 1933, intermediado pela gaúcha Mabel Lilian, filha de ingleses, lança seu primeiro livro – “Na Pior em Paris e Londres” – com o pseudônimo George Orwell. Sua ligação com a brasileira que morava em Londres lhe rendeu apoio e contatos profissionais. Ela passou a ser, também, amante e intermediária de Orwell com o pai, que o criticava por ter trocado a vida militar pela boemia.
Seu passado militar falou mais alto quando resolveu se engajar na Guerra Civil Espanhola, onde levou um tiro na garganta.
“Tornei-me pró-socialista mais por desgosto com a maneira como os setores mais pobres dos trabalhadores industriais eram oprimidos e negligenciados do que devido a qualquer admiração teórica por uma sociedade planificada”.
Nesse tempo, entra para o Partido Operário de Unificação Marxista.
“A humanidade precisa se libertar do conceito de Deus e do Diabo, e admitir que ela mesma faz o bem e o mal.”
Seus livros causam perplexidade e sucesso. Na sua lista de admiradores está Anthony Burguess, que escreveu, influenciado pelo livro “1984”, “Laranja Mecânica”. Burguess considera o livro de Orwell, uma das cinco distopias mais importantes da literatura.
David Bowie foi outro admirador. Sua intenção, ditada na revista Rolling Stones, em 1974, era a de transformar “1984” em um musical para a TV. Não deu certo.
Após a posse de Donald Trump, em 2017, esse livro bateu recorde de vendas na Amazon. As vendas tiveram um aumento de 10.000%.
“1984”, escrito no ano de 1949, teve outra venda recorde quando Edward Snowden revelou o fato de os Estados Unidos estarem monitorando líderes mundiais.
O mundo gosta de distopias.
George Orwell morreu longe dos campos de batalha. A tuberculose acabou com sua vida em 1950, quando o autor tinha 46 anos.
O Brasil é signatário da Convenção de Berna, que estabelece que os direitos autorais sobre as obras terminam setenta anos após a morte do autor.
Neste ano pandêmico – e distópico – começa a corrida para reeditar George Orwell. Ganhamos todos.
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*Ana Maria Lopes é jornalista, escritora, fundadora do Coletivo Maria Cobogó e vive, neste momento, no Brasil, uma distopia tão grande que nem mesmo George Orwell poderia imaginar.